XAVIER ROMÃO: CONVERSAS SOBRE A ESCOLA DO PORTO
XAVIER ROMÃO: CONVERSA SOBRE A ESCOLA DO PORTO
ENTREVISTA A XAVIER ROMÃO POR RAQUEL MESQUITA E GONÇALO FURTADO. //
GF- A UC na FAUP?
Xavier Romão- A cadeira surge em 2018, a Reitoria lançou um concurso de unidades pedagógicas avançadas, onde nós partilhamos um programa chamado Inovped. Na altura a arquiteta Teresa Ferreira, que era investigadora aí na FAUP lançou a ideia de criar essa disciplina de opção com 4 componentes uma componente de estrutura, uma da arquitetura paisagista com o meu colega das ciências, uma sobre o estudo das fontes bibliográficas e mapas e uma associada à gestão de riscos em património cultural, que pudessem fornecer pistas para, um planeamento arquitetónico em zonas com um forte pendor patrimonial. Esta última componente é onde entro, uma das áreas onde eu trabalho há vários anos. A minha contribuição surge nesse contexto muito específico. É uma disciplina a quatro mãos, cada um dá uma contribuição para dar aqui uma visão um bocadinho mais multidisciplinar do planeamento em arquitetura, mas ligado a áreas em particular urbanas com valor patrimonial.
Raquel Mesquita- E como é que chegou à faculdade? Foi um convite da Professora Teresa.
XR- Sim, eu já conheço a Teresa, há muitos anos, muito antes disto, foi ela que idealizou o conceito da disciplina, e convidou-me.
RM- E a nível de da própria faculdade. Que memórias é que acha que vai guardar ao ter estado nesta faculdade, o ambiente, as pessoas, os alunos, mesma a parte das instalações. O que é que vê até de diferença da FEUP?
XR- Há muitas diferenças brutais. A escala é logo uma diferença que é incontornável, estamos a falar de uma escola que tem muito menos alunos. (…) Do ponto de vista da parte mais letiva, nós tivemos um percalço aqui pelo meio com a pandemia, estamos aqui 2 anos em que a disciplina esteve a funcionar em regime à distância. Causou bastantes dificuldades, em particular devido ao facto da disciplina ter sido inicialmente avaliada com base num trabalho prático. Todo o acompanhamento à distância, teve, enfim, fortes dificuldades, como deves imaginar pelo facto de estarmos em pandemia e temos mais dificuldade em acompanhar os trabalhos com mais detalhe, não foi possível fazer visitas aos locais porque os trabalhos são sempre focados em áreas aqui no Porto. Geralmente envolvia uma visita no início ao local junto com os alunos, portanto, não foi possível fazer isso durante 2 anos. Uma das coisas que foi sempre interessante ao longo das várias edições da disciplina, é que acabamos por ter estudantes com percursos bastante variados, nalguns casos já nem eram estudantes. Na primeira edição, ainda não era a disciplina de opção e estava a funcionar num modelo de avaliação de Pós-graduação, e era mais extracurricular do curso de arquitetura e tivemos pessoas que vinham de Lisboa todas as semanas à disciplina. Só depois é que passou para uma cadeira de opção, e tivemos sempre com pessoas com um percurso bastante diferente e estudantes Erasmus. Tivemos alguns alunos de engenharia, mas neste momento só temos alunos da FAUP ou internacionais e Erasmus. O que eu noto é que é um tema, com bastante interesse. É olhar para as coisas de forma diferente, introduzir um conjunto de questões que não são habitualmente discutidas no curso de arquitetura e que nos permitem olhar para o problema de planeamento e de propostas urbanísticas de uma forma mais completa, porque introduzem ideias que inicialmente não seriam óbvias para eles.
Gonçalo Furtado- Podia desenvolver um bocadinho a natureza e esse contato com outros colegas, provavelmente para além da Teresa contactou com alguém. O ambiente, o bar, assim essas memórias pessoais.
XR- Este ano em particular, houve aqui sempre um desafio que foi correndo bem, por sorte, e este ano foi mais difícil que é abordar o encaixe no horário. Porque só por sorte, é que nós conseguimos ter um horário livre na hora da disciplina (…)
Este ano foi para mim o mais difícil, porque eu tinha aulas basicamente até à uma e as aulas na FAUP começavam às 2. (…) Saia aqui das aulas à 1, ia de carro, FAUP, almoçava lá no bar. (...). Nós somos 9000 e não sei quantos, entre estudantes, docentes e funcionários, a rossar os 10000 para uma escola que tinha capacidade para 5000 habitantes. (…). Portanto, ver essas diferenças, de lá para cá foi, foi interessante.
GF - Agora os espaços de aulas?
XR - Nós fomos tendo aulas ao longo dos vários anos, em vários sítios, inclusivamente houve um ano, em que estivemos lá em cima, na casa cor de rosa, 2 anos em que tivemos numa sala, numa das Torres, na FAUP, uma sala simpática. Este ano foi a situação mais complicada de todas, nós tínhamos aulas em 2 sítios. Uma sala, junto ao segurança que subíamos e era à esquerda 2 níveis para cima, gigantesca, super comprida (…) fazia um eco brutal.
RM - Deve ser a que era no quinto ano.
XR - É, onde nós fazemos reuniões com os trabalhos de grupo, com o eco não é assim muito prático, as sessões da parte de apresentação conceptual teórica no auditório da biblioteca. (…). Pode ser muito bonita, mas funcional é coisa que não é. As outras salas, tudo bem, não são salas propriamente desenvolvidas para aquelas aulas.
GF - E o pavilhão Carlos Ramos?
XR - O pavilhão, nós fizemos 2 sessões lá em cima, é muito simpático, apesar de não ter assim muitas portas, porque aquilo é um espaço diferente, mas funciona bem para as questões teóricas.
GF - As pessoas costumam competir por essas salas, que são as melhores, estar ali era quase como estar no meio do Jardim, não é?
XR - As nossas aulas eram à quarta à tarde, pelos vistos, não há muitas aulas e tivemos sempre à vontade porque estava sempre vazio, e aí era um sítio simpático, sim. Pavilhão muito agradável para dar aulas e para discutir e depois acabamos por fazer sempre lá o acompanhamento dos trabalhos, tinha espaços que funcionam para as 2 coisas. Nesse aspeto, funcionou bastante melhor.
RM - Qual é o tipo de conhecimento, da sua parte, que compunha a matéria e qual é a sua definição dos mesmos? Quais eram os mais importantes? Até é um bocadinho mais relativo a esta parte a ser sustentável deste desenvolvimento que vocês também falam no vosso programa.
XR - A minha contribuição aqui é introduzir um Tema que é para a maior parte deles desconhecido. E o que eu faço é introduzir um conjunto de conceitos que são relevantes para qualquer problema de planeamento ou de gestão de património, que é: o que é que pode correr mal no futuro? Que ameaças/
tipos de risco podem ocorrer? Mas também numa vertente de o que é que está já instalado, que tem um impacto negativo nos valores desse património? Sempre esta dualidade o que é que já existe, que é mau e o que é que pode correr no futuro que seja mau? A primeira parte do trabalho que eles têm que fazer, os alunos estão divididos em grupos, um por cada área, e há um grupo que vai ficar associado à identificação de problemas e risco, coisas que já existem e têm impactos negativos e riscos, coisas que poderão vir a ter efetivamente impactos negativos no futuro. Sejam eles, de origem natural ou antrópica, a ideia é que eles vão um bocadinho à descoberta, tentando perceber o que é que naquela área de estudo está mal, ou que pode vir a estar mal. Há um acompanhamento aí, em que vou fazendo perguntas, digamos, tentando conduzi-lo sem lhes dar resposta. Por vezes, eu adicionalmente ponho um cenário em cima daquela área. Tipicamente aqui no Porto é um cenário de Chuva intensa. Como é que está? Como é que está aquela administra de drenagem com vista do grau de conservação daqueles edifícios? Olha para os telhados, para as paredes, o que pode correr mal. O que é que precisa claramente de ser renovado ou reabilitado para fazer face aos impactos da água, etc. Faz-nos pensar um bocadinho em soluções que depois vão fazer parte da segunda parte do trabalho, que é a proposta que eles vão fazer para aquela área. Onde se pretende também que integrem, não soluções detalhadas, mas pelo menos estratégias que vão cobrir isto. Na parte conceptual falamos de quais são as fases, que é que tem que ter, o que é que se pretende e quais são os objetivos?
RM - Acha que os seus alunos têm noção que a parte da sustentabilidade começa na prevenção dos riscos quando chegam à cadeira ou nem por isso?
XR- Quando a coisa é exposta, parece óbvio, mas ativamente o pensar nas coisas, não o é. Em geral, a sociedade é muito mais reativa do que preventiva. Não temos dúvida, é aquela barreira que ao longo dos últimos 20 anos andamos aqui a tentar ultrapassar, mas cujo sucesso é muito lento. Na realidade temos uma questão que é a incerteza. Vai acontecer isto no futuro, está bem, mas quando? E vai ser exatamente assim, vai ser com que intensidade? Quais são seus impactos? Há um conjunto de incertezas na decisão cenários e desses impactos no futuro. Eu estou a tentar prever coisas, mas com um certo grau de incerteza, depois reflete-se na minha falta de vontade de "se calhar não vai ser bem assim, não vai acontecer, já". Esta disciplina introduz o tema, reforça a ideia, cria um bocado sensibilização para o tema. Até porque eles, em média, o aluno hoje em dia quer dizer civil quer de arquitetura, está bastante sensibilizado para a questão da sustentabilidade. É um tema que todos têm mais ou menos tem dentro da cabeça. Uma vertente assim com mais detalhe ou menos detalhe é um conceito que está claro. O que não há é muita ligação entre o que é ser sustentável e o resto que nós estamos a fazer. Na reabilitação, qual é a sustentabilidade? Onde é que está? A reutilização de equipamentos para evitar construir outros, é mais fácil reparar do que fazer de novo, porque é questão de riscos entra aí? Eu vou prevenir, para no futuro evitar ter impactos negativos que me vão custar muito mais do que agora investir antes do evento ocorrer, ou seja, eu vou-me preparar para não ter de gastar tanto no futuro.
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